João Cabral de Melo Neto, em uma de suas
poesias célebres, afirmou que as manhãs são tecidas pelos galos através de seus
cantos. Igualmente, acredito que os domingos, no nosso estado, são tecidos
pelas fumaças das chaminés que carregam os aromas das carnes que estão sendo
assadas. Assim como os domingos, nossas memórias, constantemente, são
construídas e idealizadas através desse mesmo recurso, usando desse mesmo expediente.
A
sensação é comum a todos, uma pessoa qualquer passando ao lado, aquele perfume
alcança a mente e, imediatamente, desenha uma pessoa, uma imagem, reconstrói
uma situação, interligando os detalhes e as cores. Um amor especial pode, na
maioria das vezes, ser guardado em um aroma, em uma fragrância particular, uma
chave-mestra para sensações maravilhosas.
Da
minha parte, os cheiros me trazem a infância. Como se fossem testemunhas
adultas e conscientes dos episódios infantis, eles remontam situações, em
algumas vezes, esquecidas ou ignoradas pelo consciente. O cheiro de um simples
refogado de vagem – feito em fogão sem exaustor, que inunda a cozinha com o
odor – constrói, no meu caso, a imagem de minha avó na beira do fogão, com seu
velho avental com crochê na beirada, suando, baixinha, enquanto meu avô, com
suas costas largas, aguardava sentado à mesa a chegada das panelas.
É
assim mesmo, as fragrâncias são pontes com nosso passado, portais que nos
transportam para locais já passados, já vividos, alguns bons, outros ruins, mas
todos inacessíveis de outra forma. Nesse momento, o aroma que chega a mim é o
da carne sendo servida, que traz consigo os sorrisos, os gritos, as discussões,
as conversas descontraídas e os momentos de descontração. Ou seja, um saboroso
e leve domingo.
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