Reclama-se
de tudo: do imposto, do vizinho, do tempo, da televisão, do trabalho, da saúde,
do estudo, da violência – reclamarão, alguns, até desse texto – contudo só não
se reclama de uma coisa: da falta de abraços.
Criamos
uma geração de contatos físicos limitados a demonstrações de desejos e
interesses, perdeu-se - não que tivéssemos muito antes - o simples gesto
inocente do afago sem pretensões imediatas ou recompensas. Somos órfãos do
abraço de mãe, do abraço desapegado e sem ambição. Transferimos para ele a
exigência, que já carregamos no dia a dia, do realizar por um motivo; trabalhamos
pelo salário do fim do mês, abandonamos sonhos e desejos em prol de um estilo
de vida que proporcione objetivos concretos e precificados, poucos podem dizer
que trabalham porque precisam daquilo para viver bem consigo mesmo,
independente do que receba em troca. Felizardo aquele que trabalha o mês para
suprir uma satisfação pessoal e é surpreendido por ainda receber para fazê-lo. Estamos
engaiolados em nossa própria lógica, exposta desde o início, já na época de
escola, e evidente nas perguntas que se repetiam: vale nota? Vai cair na prova?
Saímos da escola e permanecemos na rotina do cair na prova.
Abrimos
mão, dessa forma, das dádivas mais simples, dos gestos mais básicos e importantes.
Negligenciamos o poder e abrangência de um abraço, ignoramos o quão salvador e
renovador ele pode ser. Refutamos essa expressão, erguemos muros invisíveis ao
nosso redor, colocamos o outro na posição de atacante, recolhemo-nos em nossa
Troia existencial, repelindo e desencorajando qualquer “ataque”. O infeliz
nessa batalha é que não há possibilidade do surgimento de um Ulisses e seu
cavalo de madeira, o abraço virou, assim como todas as outras coisas, um meio
para um fim. Homem abraçando homem? Estranho, alguma coisa há. Homem abraçando
mulher? Com certeza, estão juntos. Mulher abraçando mulher? Coisas desse mundo
moderno; sendo todas essas respostas acompanhadas daquele tsc, tsc,
tsc...característico.
Quantos abraços você ganhou ou deu
hoje? Não qualquer abraço. Refiro-me àquele abraço de urso, abraço sem medo,
sem receio. Abraço que envolve o outro com força, que vem acompanhado de um
leve aperto na coluna do abraçado, que une as duas mãos do “abraçante”, abraço que lembra café
quente, recém passado, em uma tarde de inverno na frente da lareira. O abraço
de hoje é como café passado de um dia para o outro, não esquenta o espírito e
não é reconfortante. Estamos ocupados demais para abraçarmos e sermos
abraçados. O abraço gostoso, aquele que acalma e anima, infelizmente, está em
extinção, sem nenhum programa de proteção em andamento ou perspectiva de
sobrevida, existindo apenas quando necessário. Por enquanto.