quarta-feira, 11 de março de 2015

O menino que lutava com o Sol

Equipou-se para o combate que se avizinhava. Verificou se as ombreiras estavam no seu devido lugar, assim como o escudo e o restante da armadura. Com passos firmes, marcando a terra ainda úmida, foi em direção a sua fortaleza. Parecia muito mais um monte de entulho do que outrora havia sido sua mais imponente edificação, a verdade que surgia diante de seus olhos era que havia um grande trabalho a ser feito e o tempo não era seu cúmplice. Sem perder mais tempo, pôs-se a arquitetar sua fortaleza, pedra sobre pedra, unindo-se como se fossem partes de um corpo que se reencontravam para ganhar novamente significação. O calor, que crescia em sua nuca, anunciava que o Sol começava a vencer a batalha contra as pesadas nuvens daquela tarde. Não tinha tempo para procurar uma proteção, muito menos para vislumbrar tal batalha, pois tinha a sua própria batalha esperando para ser disputada. Os pés, uma vez ou outra, vacilavam na terra úmida que ganhava garras com o movimento incessante no mesmo ponto. O mundo, ao redor, ainda transpirava. As pedras úmidas, por vezes, mostravam-se ariscas e imprevisíveis. A construção não era simples, mas, enfim, terminou a edificação.
Contemplou o trabalho de suas mãos e maravilhou-se. Sentiu-se renovado, pronto para enfrentar um dragão se fosse preciso. O castelo erguia-se soberano em meio a uma planície de terra escura marcada por pegadas que criavam pequenos lagos independentes. Permitiu-se alguns instantes de contemplação, mas lembrou da batalha e da necessidade de abarrotar a sala de armas com munição suficiente, não queria ser sitiado sem munição, sem esperança, afinal, era um respeitado cavaleiro. Tratou de armazenar o maior número de munição que pudesse, os aldeões deveriam abrigar-se dentro da edificação. O Sol já não disputava batalha alguma, tornara-se ditador, reinava absoluto e irradiava seu calor cruelmente sobre todos. Avistou seu inimigo, estava se preparando, ficando de prontidão, será que teria tanto suprimento? Suou. Calor, disse para si mesmo, apesar de que, em seu íntimo, sabia que o calor que sentia era aquele que surge do sentimento que homem que é homem não deve ter. 
Voltou-se para o castelo, precisava de mais munição. Trabalhou incessantemente, correu, caiu, todavia conseguiu finalmente encher as reservas. Entrincheirou-se atrás do castelo e, por trás da fortaleza impenetrável, berrou:
- Estou pronto!!
A primeira laranja estourou na árvore ao lado. A segunda arrancou o vigia de sua posição e o arremessou no canil de Banditi, ainda teve tempo de ver o cão arrancar-lhe a cabeça com uma só mordida. Não havia tempo para lamentações, pegou uma das inúmeras bolachinhas que trouxera para aguentar o cerco e a comeu, um guerreiro precisa estar bem alimentado. Armou-se com duas laranjas. Com reflexo surpreendente, surgiu à direita e, sorrateiramente, acertou duas laranjas na base da fortaleza inimiga, mas pouco estrago causou. Escondeu-se a tempo de apenas ver uma laranja criar um sulco na terra onde estivera a dois segundos atrás. O Sol castigava seu esconderijo, seria uma longa tarde de sábado. Sorriu.

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