segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Sabe como é, né?



- Você nem me ligou.
- Pois é, precisamos conversar.
- Ai, lá vem bomba.
- Calma, antes de mais nada, saiba que você é muito especial.
- Tá, mas...
- Olha, eu até queria, mas você precisa entender.
- Entender o quê?
- Não dá, não podemos ficar juntos.
- Por quê?
- Como posso dizer...eu não sou assim, mas as pessoas são. São maldosas, falam por aí...sabe como é, né?
- Não sei como é! O que tem as pessoas? O que elas falam?
- Ah, não vem ao caso e...
- Como não? Está terminando comigo devido a isso, tem tudo a ver com o caso.
- Sabe a Pri?
- O que tem a Pri?
- Pois é, ela falou que já ficou com você.
- Sim, mas foi há muito tempo, em uma festa, foi algo banal.
- Exato, o problema é a banalidade. Para ela, você foi apenas uma coisa banal. Sempre que eu passar por ela, estarei com isso esfregado na minha cara. Não dá, não posso. Sabe como é, né?
- Espera aí. Você está assim por uma coisa que aconteceu há muito tempo?
- Mas é que não foi só a Pri, teve a Pri, a Renata, a Júlia e a Flavinha, só para falar de minhas amigas próximas.
- E você? Quer que eu nomeie meus amigos e conhecidos que já ficaram com você? Não há nem comparação.
- Eu entendo, veja bem, sou estudada, esclarecida, mas a sociedade é cruel. Até algum tempo atrás, homem esperava a mulher para casar. Se fico com você, imagina o que vão falar: olha lá, a Lurdinha com o Márcio! Todo mundo já andou com o Márcio. Sabe como é, né?
- Isso é um baita de um feminismo hipócrita!
- Não leva para esse lado, não. Procure entender. Ah, Márcio, não vai chorar, por favor.
- Entender? Quer dizer que vocês podem tudo e os homens não podem nada?
- Não é isso. Olha a televisão, a novela. Quer saber? Eu acho que você não quer entender. E eu não ficarei discutindo, gosto muito de você, mas o que minha família iria pensar? Infelizmente, tenho família, nossos filhos teriam avós, tias, mães de coleguinhas que já teriam ficado com você. Já imaginou a vergonha? Olha, do fundo do coração, acho, realmente, que você precisa se dar mais o valor. As mulheres não te dão o valor por isso, olha a roupa que você está usando, ou que não está usando, parece que estamos em um daqueles seriados de praias paradisíacas, em que você está fazendo o papel de salva-vidas. Você sempre parece um salva-vidas com esses braços de fora. E esse calção?
- O que tem o calção?
- Meu Deus, parece uma sunga. Você não esconde nada. Veste-se como um homem da vida.
- Mas você está com um decote enorme...
- Já disse, eu até entendo, mas a sociedade é implacável, implacável..
            Antes de sair, ela deu um último beijo em Márcio, agarrou a mão dele bem forte, olhou nos seus olhos e disse:
- Olha, até fico meio assim de dizer isso, mas gostei mesmo de ti. Se quiser, por assim dizer, me encontrar um dia desses para matar a saudade...você tem meu número. Agora, namorar, não tem como. Se valoriza, querido. Sabe como é, né?

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